Eu estava na Câmara de Vereadores de Sorocaba, acompanhando uma amiga que receberia uma comenda, quando me chegou a notícia — e um vídeo que talvez me assombre por muito tempo. Um jovem ativista havia sido baleado. Cristão, defensor de causas que reconheço, alguém que escolheu o debate público como trincheira. No carro, a caminho de São Paulo, a incredulidade virou constatação: não era “apenas mais um incidente”. Charlie Kirk foi morto em 10 de setembro de 2025, enquanto falava num evento de debate na Utah Valley University; o suspeito, Tyler Robinson, de 22 anos, está preso. Relatos de familiares mostram que ele nutria um certo ódio às ideias da vítima. O fato permanece nu e cru: mais uma vida ceifada pela intolerância.
O assassinato de Charlie Kirk representa algo mais devastador que uma tragédia pessoal — é um ataque direto ao coração do debate democrático. Kirk não era um político em campanha, protegido por seguranças e cercado por apoiadores. Era alguém que, concordemos ou não com suas ideias, tinha coragem de sentar numa cadeira no meio do campus e dizer: “Prove me wrong” (Prove-me que estou errado).
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Pense na coragem disso. Uma tenda simples, um microfone aberto, a disposição genuína para ouvir quem discorda num mundo cada vez mais polarizado e agressivo. Nada de palanques elevados ou plateias apenas com aqueles que concordam entre si, apenas a velha e boa arte de argumentar cara a cara com quem pensa diferente. Era “democracia” no sentido mais puro: crua, desprotegida, vulnerável.
E foi nessa vulnerabilidade que o ódio encontrou seu alvo.
Quando transformamos o espaço do diálogo em zona de risco, algo fundamental se quebra. O custo da palavra sobe vertiginosamente. Jovens que poderiam se tornar grandes debatedores preferem o silêncio. Universidades cancelam eventos. A sociedade empobrece de argumentos, e todos nós perdemos.
Existe um fantasma rondando as democracias, especialmente aqui nas Américas. A violência política tem mostrado um viés perturbador, recaindo desproporcionalmente sobre figuras à direita do espectro ideológico.
A direita no alvo
Jair Bolsonaro quase morreu numa facada em 2018 e carrega sequelas até hoje. Donald Trump levou um tiro na orelha em julho de 2024, durante um comício na Pensilvânia. Fernando Villavicencio foi executado no Equador em 2023 — a Justiça já condenou os assassinos e agora persegue os mandantes. Miguel Uribe Turbay foi baleado na Colômbia em junho de 2025 e morreu dois meses depois.
Esses não são casos isolados. Testemunhamos uma linha do tempo de avanço em hostilidade e violência. Quando o método para silenciar adversários políticos se torna sistemático, a democracia está em perigo mortal.
O efeito desses episódios é previsível e devastador. Não irão as pessoas cada vez mais se autocensurar? Auditórios se transformam em bunkers. Vozes incômodas que sejam desconvidadas antes mesmo de falarem qualquer coisa. O medo, assim, irá guiar o caminho do discurso público e do mercado de ideias.
A necessidade do diálogo
O próprio campus de Utah, que mantinha esses encontros como espaços sagrados da livre expressão, agora vê estudantes elaborando traumas enquanto administradores reescrevem protocolos de segurança. Como defender a liberdade acadêmica se não conseguirmos proteger quem a exerce?
Defender ideias sem blindar debatedores contra balas é entregar a pauta para quem lucra com o caos.
Não é hora de erguer muros — é hora de erguer a coragem. A resposta que importa nasce de uma decisão individual e coletiva: enfrentar, sem ódio, a tirania que tenta calar a dissidência. E reconheçamos: hoje, essa tirania tem servido frequentemente a uma esquerda que perdeu o apreço pelo contraditório.
Não precisamos concordar com tudo que Charlie Kirk defendia para honrar o modo como defendia: humildade no trato, moderação no gesto, microfone aberto ao adversário, paciência para ouvir antes de rebater. Persistir nessa postura, justamente agora, é recusar que o medo se torne árbitro do espaço público.
A violência da esquerda
Apesar da grande tendência da esquerda, a violência política não tem monopólio ideológico. A tentativa de assassinato contra Cristina Kirchner em 2022 foi real — só não se consumou porque a arma falhou. A regra deve ser cega para ideologias: proteger a fala mesmo quando nos irrita profundamente, e punir o crime independente de quem é vilão ou vítima.
Mas isso não anula a necessidade de enxergar padrões. Quando a violência se concentra desproporcionalmente em um segmento do debate público, fingir simetria é cumplicidade.
Esta semana do assassinato de Charlie Kirk deixou claro algo: a estrada em que viajamos pela história recebeu um novo marco, algo mudou para sempre. Enquanto participava do Fórum Caminhos da Liberdade em São Paulo, conversando com diversos amigos, ficou claro que essa percepção não é apenas minha, todos enxergam que algo mudou, apenas não sabemos dizer o que especificamente.
Charlie Kirk está vivo
Quando uma bala mira quem discorda, não mata apenas uma pessoa — tenta fechar a feira onde as convicções se pesam. É um ataque ao próprio conceito de que ideias devem competir em praça pública, não em cemitérios.
A escolha é nossa: ou reabrimos a banca do argumento — com coragem, reciprocidade e o peso da lei — ou acordaremos num país onde só fala quem já venceu. E, nesse país, todos nós já teremos perdido.
Charlie Kirk apostou que as ideias vencem pela força da razão, não pela força das armas. Sua morte pode não ser em vão se mantivermos essa aposta viva. O microfone continua aberto. A pergunta que fica é: quem terá coragem de pegá-lo?
Leia também: “Vítimas da intolerância”, reportagem de Anderson Scardoelli publicada na Edição 288 da Revista Oeste
Yuri Quadros é fundador do action-tank Aliança, diretor de formação do Instituto de Formação de Líderes de Belo Horizonte e conselheiro da Rede Liberdade.
Fonte: Revista Oeste
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